quinta-feira, 20 de maio de 2010

cronica de uma árvore arrancada.

Eu era uma árvore. Era porque morri, fui arrancada da minha existência pela crescente exploração imobiliária nestes anos de engorda da economia brasileira. Eu era um pé de Pata de Vaca, a verdadeira, a de flores brancas, não sei estimar quantos anos eu tinha, sou árvore não me preocupo com os anos, mas agora que morri gostaria de saber quanto tempo vivi!
Vivi numa rua pacata, a antiga Rua 12 na vila Zatt em Pirituba, São Paulo, morava na frente de uma casa de esquina perto de uma viela. As crianças jogavam bola em baixo da minha sombra. Seu José, o dono da casa, sempre deixava o carro na minha sombra. Os cachorros faziam xixi no meu tronco, mas eu não ligava, até gostava... Adubava-me. Os passarinhos, Ha Os passarinhos! Estes eu gostava quando viam se aninhar nos meus galhos ou cantar, muitas vezes era aquela algazarra danada que só passarinho sabe fazer, mas eu gostava muito, me alegrava. Os papagaios eram os meus favoritos. Eles viam pousar nos meus galhos e comer bichinhos e sementes, sem dúvida os mais barulhentos!Gosto de barulho de passarinho!
Um dia seu José vendeu a casa, foi morar em apartamento, mais seguro, menor. Ele já não precisava de uma casa tão grande. Os filhos tinham casado e mudado. D. Ana não queria mais limpar o quintal todos os dias.
Então a construtora comprou a casa, demoliu e construiu três no lugar de uma, achei interessante, o homem é muito inteligente, vejam vocês no lugar de uma, três! Quando as casas já estavam prontas (como ficaram prontas rápidas!) o problema: No lugar exato da garagem de duas das novas casas: Eu. Como Eu poderia ficar onde estava? Atrapalhando o lar de duas famílias? Assim, para o bem de todos, menos o meu, é claro, fui arrancada. Era um dia nublado, chuvoso o trator chegou de manhã bem sedo, empurrou meu tronco algumas vezes, tombei, depois com muita rapidez começou o vai e vem de serras, machados e pronto, no meu lugar um buraco no chão, depois cimento, piso e lá estavam duas garagens desimpedidas, prontas para serem usadas.
Vocês podem pensar: Nossa mas que árvore chorona, reclamona! Não conto esta história para reclamar, só para desabafar. Eu gostava de ser árvore e viver na Rua 12 lá em Pirituba, gostava de ouvir os passarinhos, ver as crianças jogando bola, abrigar o carro de seu José, observar o movimento da rua, sentir o vento balançando minhas folhas, sentir o frescor da chuva, os raios do sol...
Agora, só me resta contar essa minha história de árvore que um dia foi arrancada!


PS: desculpe o atraso, demorei mais de um ano para lhe prestes essa homenagem. Seja feliz no céu das árvores!